Eterna mediocridade

Classificar coisas em listas pode ser meio boboca mas às vezes ajuda a clarear as ideias. Os acadêmicos dão a isso o pomposo nome de taxonomia.
As seis maiores cabeças do século 20 é uma lista que gosto de fazer.
Batatolina, é lista de número arbitrário. Portanto, discutível. Mas não está em discussão. Podia ser "as mil maiores cabeças do século 20". Cada um de nós pode listar o que, quem e quantas vezes lhe der na telha.
Raramente boto pensadores e artistas em listas. É empobrecedor, obviamente. Mas em geral serve para introduzir um assunto.
O primeirão na minha lista "As seis maiores cabeças do século 20" é Freud. Não vou deitar falação sobre o porquê. Os interessados em saber podem ler, por exemplo, Freud, pensador da cultura, do professor e craque em psicanálise Renato Mezan.
O que mais admiro em Freud foi sua capacidade de usar a própria experiência e sentimentos para desenvolver suas teorias. Se voltou para dentro para sair de si mesmo. Antes de analisar outros, se analisou. Vai por mim, não é pouca ninharia. Durante o longo tempo em que escreveu a obra extensa, profunda e densa, manteve um holofote poderoso e implacável aceso em seu interior, atento aos efeitos que seu autoconhecimento em evolução diária contínua produzia em suas emoções. Mas isso não é sui generis nem raro entre grandes criadores. É o que distingue o verdadeiro criador dos viajantes.  Na minha lista, "viajantes" são aqueles que tentam desenvolver grandes teorias com base não na experiência mas na especulação (e em objetivos menos nobres como, por exemplo, desejo de sucesso e de seduzir). A lista dos viajantes é muito mais comprida. Especular (e tentar conquistar) qualquer um pode. Até eu. (Outra das minhas listas favoritas é de gente que se leva demasiado a sério e se dá muita importância, no mais das vezes perita no cultivo de aboborinha insossa.)
Os demais integrantes da minha lista "As seis maiores cabeças do século 20" são Einstein, Planck, Proust, Picasso e Heidegger. A ordem dos fatores nessa lista não altera etc.
O que mais salta aos olhos entre os listados é que, além de autodidatas qual Freud, são todos homens nascidos no século 19 que, dum só salto, levaram a humanidade direto ao século 25. O tempo cronológico é irrelevante para os gênios. E se pensar bem em cada um dos listados, você verá que cada um deles, à sua maneira, subverteu o tempo. E verá, mais importantemente ainda, que as malditas datas que nos ensinam na escola não querem dizer grande coisa. (Tenho cá para mim que as próprias escolas são irrelevantes, mas essa é outra história.) A questão é que em plena era de Facebook a maior parte da população do planeta ainda vive na Idade Média. O resto é bullshit.
Mas não era nada disso que vim aqui hoje dizer. O crux é que, não importa quantos desbravadores e benfeitores e descobridores e inventores possam existir numa época qualquer, o mundo é SEMPRE dos medíocres.
Isso é extremamente fácil de entender. O gênio é criador, o medíocre, parasita. Com a enormidade de implicações que a distinção suscita.
Apesar de Einstein, Picasso, Freud e tantos outros homens e mulheres de grande estatura, quem de fato mandou no século 20 foram vermes intelectuais e morais como Hitler, Mussolini, Stalin et caterva. Apesar dum Fernando Henrique Cardoso, que debelou a inflação com o Plano Real e sanou as contas públicas com a Lei de Responsabilidade Fiscal, quem roubou a cena e se tornou salvador da pátria foi Lula.
A história é um ininterrupto cabo de guerra. Mocinhos dum lado, bandidos d'outro. O problema é que estes são em muito maior número que aqueles e vivemos atolados na Idade Média.