Não sei se vocês sabem, mas temos quase 40
ministérios em Brasília. Na Esplanada deles. Sei que é difícil de acreditar. E
de perceber alguma diferença. Afinal, ninguém desconfia para que servem. E para
que tantos? Trinta e sete, mais exatamente. Sim, este último período merecia
ser finalizado c'um ponto de exclamação. Ou vários. Mas que é
que não merece uma fileira enorme de pontos de exclamação e interrogação nesse
governo "que aí está", como gostavam de debochar os lullomalluferos
quando arreganhavam os caninos do outro lado do balcão?
Trinta e sete ministérios, vejam vocês. E
corre à boca pequena que logo surgirão outros. Isso mesmo,
"surgirão". Como que por geração espontânea. A espontaneidade parece
mesmo ser o mecanismo que está por trás dos fatos e feitos desse governo. E a
imprevisibilidade. Vejam como são estranhas certas coisas. Certas coisas muito
erradas. E notem como a nossa realidade, que também já era estranha, vem
tomando ares de insana nos últimos tempos.
Trinta e sete ministérios (e contando, como
gostam de dizer os anglo-saxões). Caracas, a cada cinco dias, praticamente, dá
um escândalo de fechar o comércio, entortar o bico, explodir a banca,
desatar a sangria. Mas estou sendo conservador em meu cálculo, obviamente. A
conta seria essa se cada um deles produzisse apenas uma falcatrua homérica por
vez. Todos sabemos que não é bem o caso. A Taxa de Escândalos (TE) se calcula
em razão das verbas alocadas. O engraçado é que a Taxa de Paralisia (TP) se
aquilata com base na mesma equação. Um exemplo de tal heterodoxia (sim, estamos
eufemísticos hoje) é o tal de Ministério dos Transportes. Ao que consta,
trata-se dum dos mais bem fornidos de grana, recursos, equipamentos e pessoal.
E, em que pese o próprio nome, dá impressão de que vive parado. As únicas
coisas que mudam de lugar por ali parecem ser as caixinhas, as propinas e as
comissões, transportadas do bolso de empreiteiros para a cueca de certos
funcionários ministeriais. Certos funcionários igualmente muito errados.
Me custa crer que aquela senhora a quem chamam
de presidenta, sim, aquela que se instalou no Palácio do Planalto há pouco
menos de dois anos e que até hoje não se sabe direito o que faz nem o que
pretende, esteja de fato maquinando aumentar ainda mais o número de ministérios.
Se tal boato acabar por se revelar fato, só podemos concluir que essa mulher se amarra em
fortes emoções. Pior: parece nutrir um nada inexplícito gostinho de tirar uma
da cara dos brasileiros. Ou da classe média, mais propriamente. A que segura o
rojão. E o touro a unha. Quietinha da silva xavier. Doando de mão beijada ao
governo metade do que ganha. Para sustentar no lombo trinta e sete ministérios.
Thirty-seven State Secretaries. Zevenendertig ministerien. Trente-sept
ministières. Siebenunddreißig Ministerien. TrentaSette ministeri. Treinta y
siete ministeritos.
E, pombas da paz, trinta e sete ministérios!
Existirá um cristão que saiba ao menos o nome de cada um deles? A
retrorreferida ocupante do Palácio, por exemplo. Sabê-lo-á ela? Aposto com quem
quiser que não. Cenzão. Bem que um ou uma jornalista de peito (tá certo, vocês
entenderam), numa dessas entrevistas coletivas que nossos presidentes
concedem quando saem do país (de onde vem esse caipiríssimo costume,
aliás?), podia pedir à dona do Alvorada que enumerasse seus ministérios,
só para a gente conferir e ver se estavam todos lá. Fosse eu tal jornalista,
deixava até que ela contasse nos dedos. Isto é, se a segurança já não tivesse
me jogado pela janela antes.
(Falando nisso, acabo de constatar uma grande
coincidência. Hoje cedo a atriz Regina Casé gravou uma entrevista com a tal da
presidenta no hospital Rede Sarah, em Brasília. Ufa, fiquei mais tranquilo.
Estou certo de que durante o bate-papo com a dona a Regininha levantou a
questão. Qualquer um levantaria, não levantaria? Vou ficar de olho grudado na
tevê, à espera do programa. E da entrevista. Estou morrendo de curiosidade de
saber os nomes desses benditos. Desses trinta e sete ministérios.)
((Não, se algum de vocês tentar quebrar meu
barato insinuando que não é nada disso, que a única coisa que a Regininha
levantou na gravação foi a bola para a dama de vermelho bater de prima e marcar
um golaço, dar uma rainha da cocada preta, botar banca de gerentona e
maledicências do tipo, então é melhor vocês ficarem de biquinhos fechados.
Confio plenamente na Regininha. E na dama. Estou certo de que, assim que ambas
se encontraram diante das câmaras, a entrevistadora mal deu tempo à
entrevistada para puxar a aba daquele palitozinho estilo Mao e tascou na bucha: "Presidenta, quais são os
nomes dos trinta e sete ministérios do seu governo?" Não me venham com intrigas, por
favor.))
Não sei se porque sou um sujeito que se
indigna muito facilmente demais, mas, Dio mio, trinta e sete
ministérios, que peso me dá no coração. Ainda se conseguisse poder evitar
ficar imaginando (acho que acabei de quebrar o recorde do Vinícius) tudo que
existe em cada um deles...
Peraí! Será esta a razão por que a tal dama de
vermelho evita saber também? Agora entendi! Finalmente. Tá explicado. O que o cérebro não sabe o coração não sente. Vai ver, também é por isso que ela não sabe
de muitas outras coisas ruins que andam acontecendo por lá, não é mesmo? Da
maioria, vocês acham? Nossa! Será? Cruz credo, meu.
Trinta e sete ministérios, Deus o livre,
minha gente. Quantos desocupados haverá em cada sala de cada andar de cada
prédio de cada repartição de cada sede de cada um deles? Já ouvi dizer que
muitos funcionários do governo, assim que chegam em seus gabinetes
refrigerados, botam as pernas em cima da mesa e passam o dia todinho a sugar
uma xicarazinha de café de tantos em tantos minutos, jogando charminho pra cima
da secretária, falando ao celular, tratando de assuntos particulares e
executando outras atividades essenciais para o bom andamento da nossa estimada
máquina pública.
Será verdade? Que é que vocês aí fora acham?
E já me disseram também que vários sequer vão
ao gabinete — simplesmente assinam o ponto e puxam o carro em seguida. (Sei
não, mas desconfio que no fim esses aí dão menos prejuízo à retromencionada
máquina.)
E — que horror! — fiquei sabendo de outro
boato ainda: a maioria desses esforçados trabalhadores nem o tal de ponto
assinam. Resumem-se a passar na Tesouraria (assim mesmo, com maiúscula, pois é
a Tesouraria, pombas! a que garante o pão nosso de cada dia da rapaziada) no
comecinho de cada mês para receber aquele checão gordo que benza-Deus. (Ai que
inveja...)
Trinta e sete ministérios, Jesus Christ.
As paredes estão girando. Acho que vou cair. Estou zonzo. De tentar imaginar
que é que tem lá dentro. Que é que fazem lá dentro. Quem é que fica lá dentro.
Fazendo o quê. Que será que conversam, Pai amado? Não me diga que falam de
futebol, tenha a santa paciência. Não falam de nada? Será? Ficam mudinhos das 8
às 17? Uau! Deve ser estranho.
Mas não tão estranho quanto a última que
escutei.
Que entre os trinta e sete ministérios há um
que se chama "da Cultura". E que esse Ministério da Cultura tem até
um acróstico: MinC.
Uau, uau, uau!
E que nesse tal de MinC tem uma... uma...
ministra!
Mas será possível?
Quer dizer que temos uma ministra da Cultura?
Cacilda, que será que ela faz?
Quem será essa ministra?
Bom, dada a importância do cargo, vocês podem
até imaginar, não podem?
Assim, como aquela que se denomina presidenta,
essa aí da Cultura deve ser uma,
digamos, enciclopédia ambulante.
Na certa tem pós-doutorado em Filosofia da
Arte.
E cinco ou seis de seus livros sobre Política
Cultural do Estado foram adotados nas principais escolas de Educação, Letras,
Jornalismo, Artes Plásticas e outras pelo Brasil afora.
E quero crer também que essa ministra enverga
o que os doutos chamam de reputação
ilibada.
Uma mulher aversa a demonstrações de
frivolidade, futilidade, mesquinhez. A surtos de peruice. A declarações
bombásticas e autovexaminosas. A tomas-lá-dá-cá.
Uma mulher de vida pessoal exemplar.
Cujo comportamento representa um esteio, um
norte para milhões de jovens que tanto carecem dum bom rumo em suas vidas.
Dito isso, acho que podemos nos dar por
satisfeitos.
Trinta e sete ministérios. Um, da Cultura.
Estamos em boas mãos.
Podemos relaxar.
